terça-feira, 18 de outubro de 2011

martheando [ 2 ]

'Vou ao supermercado e constato o crescimento do setor de dietéticos. Abro revistas e me deparo com as exigências de se ter um corpo esbelto. As clínicas de cirurgia plástica estão com a agenda lotada de homens e mulheres esperando sua vez para lipoaspirar, cortar, reduzir. A sociedade toda conspira a favor da magreza, e de certo modo isso é positivo, ser magro faz bem para a auto-estima e para a saúde. Mas não tenho visto ninguém estimular outro tipo de dieta igualmente necessária para o bem-estar da população. Encontro suco light, chocolate light, iogurte light, mas pessoas light são raridade. Muita gente se preocupa em ser magro, mas não se preocupa em ser leve.

Tem criatura aí pesando 48 quilos e que é um chumbo. São aqueles que vivem se queixando. Possuem complexo de perseguição, acham que o planeta inteiro está contra eles. Não se dão conta da sua arrogância, possuem certeza de que são a razão da existência do universo. Estão sempre dispostos a fazer uma piadinha maldosa, uma fofoquinha desabonadora sobre alguém. Ressentidos, puxam o tapete dos outros para se manter em pé. Não conseguem ver graça em nada, não relevam as chatices comuns do dia-a-dia, levam tudo demasiadamente a sério. São patrulhadores, censores, carregam as dores do mundo nas costas. Magrinhos, é verdade. Mas que gente pesada.

Ser minimalista todo mundo acha moderno, mas ser leve - cruzes! – parece pecado mortal. Os leves, segundo os pesados, não têm substância, não têm profundidade, não têm consistência intelectual: não são leves e, sim, levianos. Os pesados não conseguem fechar o zíper das suas roupas de tanto preconceito saltando pra fora. Não bastasse a carga tributária, a violência, a burocracia e a corrupção, ainda temos que enfrentar pessoas rudes, sem a menor vocação para se divertir. Diversão - segundo os pesados, mais uma vez - é algo alienante e sem serventia. Eles não entendem como alguém pode extrair prazer de coisas sérias como o trabalho e a família. Não entendem como é que tem gente que consegue viver sem armar barracos e criar problemas.

Eu proponho uma campanha de saúde pública: vamos ser mais bem-humorados, mais desarmados. Podemos ser cidadãos sérios e respeitáveis e, ao mesmo tempo, leves. Basta agir com mais delicadeza, soltura, autenticidade, sem obediência cega às convenções, aos padrões, aos patrões.

Um pouco mais de jogo de cintura, de criatividade, de respeito às escolhas alheias. Vamos deixar para sofrer pelo que é realmente trágico e não por aquilo que é apenas um incômodo, senão fica impraticável atravessar os dias. Dores de amor, falta de grana e angústias existenciais são contingências da vida, mas você não precisa soterrar os outros com seus lamentos e más vibrações. Sustente seu próprio fardo e esforce-se para aliviá-lo. Emagreça onde tem que emagrecer: no espírito, no humor.

E coma de tudo, se isso ajudar.'

[ a importância de perder peso - martha medeiros ]

domingo, 5 de junho de 2011

martheando

Há quem diga que o tempo não existe, que somos nós que o inventamos e tentamos controlá-lo com nossos relógios e calendários. Nem ousarei discutir esta questão filosófica, existencial e cabeluda. Se o tempo não existe, eu existo. Se o tempo não passa, eu passo. E não é só o espelho que me dá certeza disso.

O tempo interfere no meu olhar. Lembro do colégio em que estudei durante mais de uma década, meu primeiro contato com o mundo fora da minha casa. O pátio não era grande – era colossal. Uma espécie de superfície lunar sem horizontes à vista, assim eu o percebia aos sete anos de idade. As escadas levavam ao céu, eu poderia jurar que elas atravessavam os telhados. Os corredores eram passarelas infinitas, as janelas pareciam enormes portões de vidro, eu me sentia na terra dos gigantes. Volto, depois de muitos anos, para visitá-lo e descubro que ele continua sendo um colégio grande, mas nem o pátio, nem os corredores, nem as escadas, nada tem o tamanho que parecia antes. O tempo ajustou minhas retinas e deu proporção às minhas ilusões.

A interferência do tempo atinge minhas emoções também. Houve uma época em que eu temia certo tipo de gente, aqueles que estavam sempre a postos para apontar minhas fraquezas. Hoje revejo essas pessoas e a sensação que me causam é nem um pouco desafiadora ou impactante. E mesmo os que amei já não me provocam perturbação alguma, apenas um carinho sereno. E me pergunto como é que se explica que sentimentos tão fortes como o medo, o amor ou a raiva se desintegrem? Alguém era grande no meu passado, fica pequeno no meu presente. O tempo, de novo, dando a devida proporção aos meus afetos e desafetos.

Talvez seja esta a prova da sua existência: o tempo altera o tamanho das coisas. Uma rua da infância, que exigia muitas pedaladas para ser percorrida, hoje é atravessada em poucos passos. Uma árvore que para ser explorada exigia uma certa logística – ou ao menos um “calço” de quem estivesse por perto e com as mãos livres – hoje teria seus galhos alcançados num pulo. A gente vai crescendo e vê tudo do tamanho que é, sem a condescendência da fantasia.

E ainda nem mencionei as coisas que realmente foram reduzidas: apartamentos que parecem caixotes, carros compactos, conversas telegráficas, livros de bolso, pequenas salas de cinema, casamentos curtos. Todo aquele espaço da infância, em que cabia com folga nossa imaginação e inocência, precisa hoje se adaptar ao micro, ao mínimo, a uma vida funcional.

Eu cresci. Por dentro e por fora (e, reconheço, pros lados). Sou gente grande, como se diz por aí. E o mundo à minha volta, à nossa volta, virou aldeia, somos todos vizinhos, todos vivendo apertados, financeira e emocionalmente falando. Saudade de uma alegria descomunal, de uma esperança gigantesca, de uma confiança do tamanho do futuro – quando o futuro também era infinito à minha frente.


[ a interferência do tempo ]

terça-feira, 24 de maio de 2011

martheando

'A maioria dos nossos tormentos não vem de fora, estão alojados na nossa mente, cravados na nossa memória. Nossa sanidade (ou insanidade) se deve basicamente à maneira como nossas lembranças são assimiladas. “As pessoas procuram tratamento psicanalítico porque o modo como estão lembrando não as libera para esquecer.” Frase do psicanalista Adam Philips, publicado no livro O flerte.

Como é que não pensamos nisso antes? O que nos impede de ir em frente é uma lembrança mal lembrada que nos acorrenta ao passado, estanca o tempo, não permite avanço. A gente implora a Deus para que nos ajude a esquecer um amor, uma experiência ruim, uma frase que nos feriu, quando na verdade não é esquecer que precisamos: é lembrar corretamente. Aí, sim: lembrando como se deve, a ânsia por esquecimento poderá até ser dispensada, não precisaremos esquecer de mais nada. E, não precisando, vai ver até esqueceremos.

Ah, se tudo fosse assim tão simples. De qualquer maneira, já é um alento entender as razoes que nos deixam tão obcecados, tristes, inquietos. São as tais lembranças mal lembradas.

Você fez cinco anos, sonhava em ganhar a primeira bicicleta, seu pai foi viajar e esquecer. Uma amiga íntima, que conhecia todos os seus segredos, roubou seu namorado. Sua mãe é fria, distante, e percebe-se que ela prefere disparado sua irmã mais nova. E aquele amor? Quanta mágoa, quanta decepção, quanto tempo investido à toa, e você não esquece – passaram-se anos e você, droga, não esquece.

Essas situações viram lembranças, e essas lembranças vão se infiltrando e ganhando forma, força e tamanho, e daqui a pouco nem sabemos mais se elas seguem condizentes com o fato ocorrido ou se evoluíram para algo completamente alheio à realidade. Nossa percepção nunca é 100% confiável.

O menino de cinco anos superdimensionou uma ausência que foi emergencial, não proposital.

Você nem gostava tanto assim daquele namorado que sua amiga surrupiou (aliás, eles estão casados até hoje, não foi um capricho dela).

Sua mãe tratava as filhas de modo diferenciado porque cada filho é de um modo, cada um exige uma demanda de carinho e atenção diferente, o dia que você tiver filhos vai entender que isso não é desamor.

E aquele cara perturba seu sono até hoje porque você segue idealizando o sujeito, se recusa a acreditar que o amor vem e passa. Tudo parecia tão perfeito, ele era o tal príncipe do cavalo branco sem tirar nem pôr. Ajuste o foco: o coitado foi apenas o ser humano que cruzou a sua vida quando você estava num momento de carência extrema. Libere-o dessa fatura.

São exemplos simplistas e inventados, não sou do ramo. Mas Adam Phillips é, e me parece que ele tem razão. Nossas lembranças do passado precisam de eixo, correção de rota, dimensão exata, avaliação fria – pena que nada disso seja fácil. Costumamos lembrar com fúria, saudade, vergonha, lembramos do gosto pelo épico e pelo exagero. Sorte de quem lembra direito.'

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010


hoje não tem escapatória. seja a sua família grande ou pequena, muito provavelmente você terá que se confrontar com a ceia de natal.

realmente não sei se nessa hora o tamanho da familía é proporcional ao constrangimento. em famílias pequenas, o assunto certamente acaba logo e ficam todos com aquela cara de banana sentados no sofá, empanturrados de tanto comer, sentindo vergonha alheia pela xuxa, didi ou qualquer coisa do gênero que esteja passando na televisão nessa data especial.

falando nisso, onde está a cantora simone? eu elaborei uma teoria de que durante o ano, ela se escondia, só aparecendo em meados de novembro ou dezembro para cantar a fatídica canção do natal e ano novo, ganhar algum dinheiro e depois sumir novamente por outros onze meses. não sei se é porque eu não assisto mais televisão, principalmente depois do advento da banda larga, mas esse ano senti a ausência dela.

ao natal: hoje é o dia (ou melhor, a noite) de encontrar aqueles parentes que você não viu o ano inteiro, mas que vão dizer que te amam. te amam tanto que não lembraram do seu aniversário (exceto os que tem orkut - ainda), ou não foram te visitar no hospital depois do acidente de trânsito que você sofreu. sem falar que vão te encher de perguntas para tentar resumir em no máximo, três frases, todos os seus esforços durante o último ano.

''tá namorando? tá estudando? tá trabalhando?'


se você ousar responder não para alguma dessas três perguntas, vai escutar que a sua geração não quer nada mesmo. e muito provavelmente, o interlocutor vai dizer que com a sua idade, já tinha saído de casa, constituído família, comprado o primeiro apartamento no grajaú e um fusca azul-calcinha. e você vai se perguntar o que tem a ver com isso.

se você responder sim às três perguntas acima, será imediatamente metralhado com outras perguntas mais específicas, para o "detetive" em questão elaborar o seu relatório interno sobre a sua vida, o qual será útil para falar sobre você com os outros parentes depois.

nunca escapamos também daquela tia (às vezes ela nem mesmo é sua tia, é uma mera agregada da família, que foi vizinha de porta da sua mãe em 1977 naquele conjugado na glória) que vai dizer: "nossa, como você cresceu!". mas como já somos grandes, não vai mais apertar nossas bochechas como há alguns anos atrás.

sem falar no tio tarado (repito que não necessariamente é mesmo seu tio, pode até mesmo ser o porteiro do seu prédio que vai passar de apartamento em apartamento para montar a ceia da família dele com pedaços da ceia dos moradores) que vai fazer alguma piada do gênero:

'e aí, vai cair de boca primeiro no peru ou na rabanada?'

ou você não responde e sorri de volta para o aspirante a comediante ou inocentemente, diz que vai pegar um copo de refrigerante e foge dali.

talvez aconteça de um casal de tios (provavelmente, a mulher é sua tia mesmo, que está em seu 6º marido, tendo o alcoolismo como traço comum entre os seis, talvez seja o critério de seleção dela) exceder-se no vinho e cometer alguma gafe, como cair na porrada em público por ciúmes ou então trancar-se-ão no banheiro para satisfazerem a lascívia um do outro.


em suma, o que eu quero dizer é para não nos esquecermos do verdadeiro sentido do natal: encher a cara de comida e de bebida para depois sentirmos remorso por tais excessos e novamente, colocarmos como resolução de ano novo emagrecer alguns quilos e adotar um modo de vida mais saudável.

enfim, tenho que parar de ficar divagando por aqui e colocar as coisas no carro. afinal, natal que se preze é no subúrbio, na casa da tia nely ou do seu raimundo. quem mora na zona sul vai fazer o tradicional passeio de final de ano por bairros como coelho neto, madureira, cachambi... e se a sua casa fica em algum desses lugares, provavelmente o anfitrião será você mesmo.



feliz natal procês!


terça-feira, 6 de abril de 2010

free beth luchese!!!

e a casa da minha mãe começa a ficar com cheiro da casa da vovó...
(?)

constatei isso no almoço de páscoa, ontem.

terça-feira, 30 de março de 2010

e na fila do caixa do hortifruti...

- minha filha, a sua batata tá feia, ó! tá com uns defeitinhos, tá estragada! vai lá trocar... eu guardo o seu lugar!

- ih, é mesmo?? ah, brigada, senhora! a senhora é muito simpática!

- olhando assim você, eu me lembro do meu filho: foi morar com a mulher, deu no que deu, né? nunca olha a validade dos produtos... compra tudo errado.... acaba estragando tudo... HAHAHA

(risada de vovó)

- hehehe... é verdade.... essa vida não é mole.... hehehe